"Talvez eu tenha escrito livros que queria encontrar na minha adolescência e não encontrei", diz Jeferson Tenório
Em 2022, em entrevista ao Posfácio Podcast, o autor falou justamente sobre a importância de "O avesso da pele" ser lido nas escolas. Algo que, agora, "autoridades" tentam impedir
Se você acompanha a literatura nacional, deve ter visto um assunto ganhar protagonismo nos últimos dias: a censura ao livro “O avesso da pele”, de Jeferson Tenório, em escolas do Rio Grande do Sul e do Paraná. Esse livro foi vencedor do Prêmio Jabuti em 2021, um dos mais importantes da literatura nacional, e foi selecionado em 2022 pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), justamente para chegar a professores, professoras e estudantes de escolas públicas de todo o país. Nada mais justo. “Mas tem palavras de baixo calão”, uns disseram. “Mas tem sexo”, berraram outros. Frases que me dizem outra coisa: essas pessoas não querem encarar a essência do livro. Elas não querem ler, discutir, pensar sobre racismo e sobre relações familiares, além da própria educação pública.
Em 2022, o Jeferson Tenório participou do Posfácio Podcast, ao lado de Paulo Scott, e nós conversamos justamente sobre a importância desse livro ser lido nas escolas, formar novos leitores. Tenório fez algumas reflexões muito importantes e, agora, ainda mais simbólicas:
“É um projeto literário pensar na formação de leitores”. Disse ainda: “Talvez eu tenha escrito livros que queria encontrar na minha adolescência e não encontrei”. Livros como esse que hoje, conservadores querem tirar de circulação.
Ouça o episódio:
Carioca radicado em Porto Alegre, Jeferson Tenório é graduado em Letras e mestre em Literaturas Luso-Africanas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutor em Teoria Literária pela PUC-RS. Estreou na literatura com o romance “O beijo na parede” (2013), eleito o livro do ano pela Associação Gaúcha de Escritores. É autor também de “Estela sem Deus” (2018). Ele foi professor de Língua Portuguesa e Literatura na rede pública de ensino. Tenório conhece a realidade da educação brasileira.
“O avesso da pele” é a história de Pedro que, após a morte do pai, Henrique, assassinado numa desastrosa abordagem policial, sai em busca de resgatar o passado da família e refazer os caminhos paternos. Com uma narrativa sensível e por vezes brutal, Tenório traz à superfície um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, e um denso relato sobre as relações entre pais e filhos. É um livro que precisa ser lido, por pessoas de todas as idades, mais do que nunca.
E, bom, talvez isso esteja acontecendo. As vendas de "O Avesso da Pele" aumentaram em 400% na Amazon desde sexta-feira, quando o livro foi censurado no RS.
Mudando de assunto…
Escrevo essa newsletter no dia 6 de março, aniversário de meu escritor favorito: Gabriel García Márquez. Em breve tem livro inédito dele por aí (ansiosa!). Falamos sobre isso aqui. Enquanto “Em agosto nos vemos” não chega, pra gente poder comentar no podcast, quero recomendar um episódio antiguinho, em que eu conto minha jornada para chegar até a cidade em que Gabo nasceu - Aracataca, na Colômbia - no dia em que completei 30 anos. Se prepare: tem lágrimas.
Agora, lágrimas de alegria!
A série especial sobre literatura catarinense produzida pelo Posfácio Podcast ficou em 2° lugar na categoria Áudio no Prêmio ACI Ocesc🎉
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Stefani
sempre que há episódios de censura como este, é reconfortante saber que o tiro sai pela culatra e a procura pela obra aumenta.