"Literatura Submersa": Um ano depois da enchente no Rio Grande do Sul, como está a restauração de livros em Santa Catarina
Trabalho feito em laboratório da UFSC para recuperar obras atingidas pela enchente no estado vizinho fez parte da história contada em episódio especial do Posfácio Podcast
Entre abril e maio de 2024, uma enchente sem precedentes atingiu o Rio Grande do Sul. Daqui de Santa Catarina, observávamos angustiados o que acontecia no estado vizinho. Bom, eu observava, enquanto muita gente agia. Uma dessas pessoas era o professor Cezar Karpinski, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele sabia que a prioridade era que o atendimento humanitário chegasse às pessoas atingidas pela tragédia, mas já tinha outra preocupação: os acervos históricos.
No decorrer dos dias, começaram a surgir imagens de bibliotecas inundadas, arquivos inteiros de livrarias e editoras no lixo. O impacto no mercado editorial e no setor literário começava a aparecer. E foi essa história que o Posfácio Podcast contou no episódio especial narrativo “Literatura Submersa”, lançado em outubro do ano passado.
Nesse conteúdo documental, a história do professor da UFSC se cruza com a de Jean Teodomiro dos Santos, bibliotecário da pequena cidade de Camaquã, e com a do secretário de Cultura de Igrejinha, Vinicius Mello. Outra personagem importante é a escritora Julia Dantas, que com sua escrita sensível, guiou meu olhar para esse aspecto da tragédia.
Coordenador do Laboratório de Conservação e Restauração da UFSC, o professor Cezar iniciou exatamente um ano atrás uma rede de esforços para salvar obras essenciais no registro da história local e nacional que ficavam nas bibliotecas do RS. Em setembro, recebeu livros históricos e inéditos de Camaquã e Igrejinha, que foram congelados para posterior restauração.
Hoje, oito meses depois, a recuperação avança no laboratório. O professor Cezar compartilha imagens nas redes sociais:
“Os documentos chegaram aqui em setembro. Nós estabelecemos um protocolo de segurança e de processamento técnico até novembro. De setembro a outubro, a gente ficou discutindo isso, e no início de novembro, então, eu decidi, como gestor, como coordenador do projeto, fazer a execução do descongelamento e da secagem. Fiz isso no mês de dezembro, então todos os documentos foram descongelados e secos”, explica o professor.
Em “Literatura Submersa”, esse processo de congelamento dos livros para posterior recuperação é explicado.
“Estão agora aqui, no laboratório, passando por higienização. Nós já higienizamos cerca de 60% dos documentos e já temos uma equipe de voluntários higienizando com pó de borracha”, completa Cezar.
Todo esse trabalho tem dependido, e muito, do esforço pessoal do professor:
“Eu aprovei um projeto na Lei Rouanet, mas não consegui ainda patrocinadores para isso. Então eu estou seguindo com as minhas pernas. Ofereci um curso em janeiro, e o recurso desses cursos online que eu estou fazendo aqui pelo laboratório financiam todos os projetos que eu tenho. Não é só esse projeto de Igrejinha e Camaquã, tem vários projetos em desenvolvimento aqui que atendem as comunidades, principalmente aquelas instituições que não têm condições nenhuma de fazer tratamento”.
Todas as tardes, no laboratório, é feito o tratamento do acervo de Igrejinha e Camaquã pelas voluntárias e pela bolsista do projeto, sob os olhares atentos do professor Cezar.
Episódio premiado
A história contada em “Literatura Submersa” foi super reconhecida, o que me deixa cheia de orgulho e de vontade de seguir em frente. O episódio ficou em terceiro lugar na categoria Nacional do Prêmio da Associação Rio Grandense de Imprensa (ARI):
Também conquistou o segundo lugar na categoria áudio do Prêmio da Associação Catarinense de Imprensa (ACI):
A enchente não terminou
A perda de arquivos urbanísticos armazenados no prédio da antiga Secretaria Municipal de Obras e Viação (Smov) virou caso de polícia. A promotora da Promotoria de Meio Ambiente do Ministério Público Annelise Steigleder pediu para a Polícia Civil investigar o episódio, de olho em crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural e também de falsidade documental.
Número de vítimas fatais da enchente é atualizado, quase um ano após enxurradas – A Defesa Civil do Rio Grande do Sul confirmou mais uma vítima da enchente que assolou o estado no ano passado – com a atualização, o número chega a 184 mortos – cinco das vítimas eram moradoras da capital. Um ano depois do início das inundações, 25 pessoas seguem desaparecidas.
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Beijos e até a próxima,
Stefani